Engenho na Paraíba inova e usa técnicas de bioconstrução

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Murilo Coelho. Foto: Márcia Dementshuk

 

“Cada barril conta uma história”, revela Murilo Coelho, apontando para as peças que guardavam o líquido em descanso. “Daqui vem o ‘blend’, a combinação de sabores que traz qualidade e jamais permitirá que uma cachaça seja igual a outra; mas também permite a cada marca ser identificada pela sua característica original”. É no lugar onde a cachaça envelhece que o fundador do Engenho Nobre fala como conquistou, nos últimos dois anos, três prêmios internacionais e a classificação como a 12ª melhor cachaça do Brasil na categoria Branca.

Recentemente, Murilo Coelho decidiu transferir o engenho do município de Sobrado para Cruz do Espírito Santo, onde adquiriu um determinado lote de terra e está instalando os equipamentos para a produção da cachaça. Em frente ao terreno corre o Rio Paraíba, o mesmo que transbordou em uma enchente e inundou a cidade em 1985 e em outras épocas. A estrada foi elevada para conter uma nova ameaça natural e a cidade convive com a barreira que encobre a vista para o rio.

No finalzinho de 2019, Engenho Nobre obteve aprovação do crédito de R$ 80 mil do Empreender Paraíba. O investimento será em equipamentos e na estrutura para acolher visitantes. Historicamente, Cruz do Espírito Santo leva o nome de um antigo engenho construído na região antes da invasão holandesa do século XV e vários engenhos surgiram por ali nos séculos seguintes.  “A cidade abre uma rota turística bonita pelo interior à caminho de Areia, Bananeiras, onde hoje estão outros produtores de cachaça. Esta é uma forma de atrair o visitante para Cruz do Espírito Santo. Queremos reavivar um plano que havia da construção de um museu da cachaça e vamos trabalhar nesse sentido”, diz Murilo Coelho. Próximo ao Engenho Nobre está o Engenho São Paulo, maior produtor de cachaça de alambique do Brasil.

Na tentativa de levantarmos alguns dados precisos para esta matéria, recebemos um alerta de Maurício Carneiro, um especialista no produto da Paraíba: “O dado que eu tenho é que em Areia e Campina Grande são 69 engenhos registrados. Tenho essas informações com base no Anuário da Cachaça 2019, do Ministério da Agricultura, [Pecuária e Abastecimento]. Na verdade, há muita produção informal e não temos uma estatística segura. Mas sabemos que constam na lista dos maiores contribuintes de ICMS na área de cachaça no Estado no estado as cachaçarias São Paulo e a Matuta.”

 

Produção é diferenciada pelo conceito de sustentabilidade

 

A produção do Engenho Nobre se diferencia pelo conceito e pelo cuidado nas medidas do blend. Abrindo os barris para que pudéssemos sorver os diferentes aromas, Murilo Coelho revelou que é engenheiro civil e de cachaça só entendia pelo gosto de beber – com moderação. “Nossa família é natural de Minas Gerais, onde os engenhos também são tradição e meu avô costumava dizer que ‘engenheiro é dono de engenho’. Sua previsão se concretizou e aqui estou!”

Murilo fez cursos de preparação e produção da cachaça. Mas a vocação de engenheiro civil ressalta na construção inovadora das unidades do engenho. Murilo empregou uma técnica criada por um arquiteto iraniano que vive nos Estados Unidos, Nadir Khalili, o “superadobe”. “Usei sacos de batatas cheios de areia para construir as paredes em formato arredondado até o teto, que termina como uma cúpula. O material é um isolante térmico natural; mantém uma temperatura agradável e tem aberturas para ventilar. Só o acabamento é feito com cimento para impermeabilizar”, explicou Murilo.

Outro conceito de sustentabilidade empregado na infraestrutura do engenho é a captação de água, que será em parte da chuva e em parte de um poço. E ainda, o esgoto da produção é canalizado para um tratamento através da evapotranspiração. “O processo de tratamento do esgoto passa por bacias subterrâneas até restar água com nutrientes que é conduzida para irrigação de bananeiras. As bananeiras puxam essa água, aproveitam os nutrientes e a água é jogada por ela para a natureza. Uma bananeira joga até 70 litros por dia de água no meio ambiente”.

Murilo Coelho também atenta para a manutenção do arranjo produtivo da cachaça e adquiri a cana-de-açucar dos produtores locais, na sua maioria assentados.

A produção da cachaça, por si só, é uma atividade com 100% de aproveitamento de sua fabricação. Depois de extraído o caldo, o bagaço é usado na queima do alambique, como elemento para compostagem, ou alimento para bovinos. O vinhoto – ou vinhaça – que é o resíduo da destilação, também pode ser usado na compostagem.

Dessa forma, o engenho é construído levando em consideração a permacultura, que engloba essas alternativas para evitar o esgotamento dos recursos naturais cuidando da terra e das pessoas. Com esses conceitos e o segredo da mistura do blend (esse, Murilo não revela!) o Engenho Nobre produz cinco marcas de cachaça destinadas a agradar diferentes paladares.

 

Empresário pretende transferir conhecimento

 

A articulação para a implantação de inovações no Engenho Nobre teve o apoio da Fundação de Apoio à Pesquisa da Paraíba (Fapesq). O fortalecimento do Arranjo Produtivo da Cachaça é uma das diretrizes do Governo do Estado da Paraíba, pela Secretaria-Executiva Estadual da Ciência e Tecnologia. O presidente da Fapesq, Roberto Germano, e o técnico da Fapesq, Moab Barbalho, realizaram, ao longo de 2019, reuniões com vários empresários e as associações do setor.

O Programa Empreender Paraíba foi uma alternativa para o financiamento, pois é voltado para o apoio ao empreendedorismo na Paraíba.

O Empreender-PB teve início em 2011 e, desde então, já liberou cerca de 171 milhões para mais de 30 mil pessoas físicas e jurídicas em diversos municípios da Paraíba.

Mais de 3 mil pessoas (físicas e jurídicas) receberam financiamento em 2019 num total de aproximadamente R$ 20 milhões. O Empreender Paraíba tem várias linhas de crédito, sendo que as mais acessadas são a Profissional Liberal; a Juventudes; e a Pessoa Física – aquele que tem um projeto mas precisa montar a empresa. As inscrições são abertas por municípios e informadas pelos veículos de comunicação e redes sociais. As inscrições, quando o edital é aberto, são feitas pelo site empreender.pb.gov.br.

“O Programa Empreender facilita muito, disse Murilo Coelho. Eu vou ter uma carência de seis meses e 30 meses para pagar com um juro de 0,65% ao mês. Vou poder comprar equipamentos e prepara uma estrutura diferente no engenho.” Murilo pretende receber estudantes do Ensino Médio e de nível superior para apresentar os conceitos da bioconstrução, da importância do produto para a história, a cultura e a economia da Paraíba e promover o consumo consciente.

Fonte: https://paraiba.pb.gov.br/diretas/secretaria-da-educacao-e-da-ciencia-e-tecnologia/horizontes-da-inovacao/noticias/engenho-na-paraiba-inova-e-usa-tecnicas-de-bioconstrucao

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